O “desligar” do microfone dominical

OPINIÃO

Crédito:📸 Divulgação

Por Iumara Rodrigues*

“Silvio Santos vem aí…” Este certamente é o refrão cantado no plano superior desde a madrugada deste sábado, 17 de agosto de 2024. As “colegas de trabalho”, fãs, colaboradores, familiares, imprensa e meio artístico ainda tentam assimilar a perda do maior comunicador do país.

Quando nasci, Senor Abravanel já era Silvio Santos. Dos 93 anos de idade, 65 foram dedicados à televisão brasileira. Na minha memória afetiva estão os domingos inteiros na frente da TV… Show de calouros, Portas da esperança, Roletrando, Troféu Imprensa, Qual é a música e tantos outros quadros e programas do dono da risada mais imitada do Brasil. Lembro também de minha mãe pagando o carnê do Baú da Felicidade, que comprava esporadicamente.

O camelô que se tornou empresário e comunicador começou vendendo canetas e capas para documentos. Nessa função, já demonstrava oratória eficaz, voz marcante e todas as habilidades necessárias para a comunicação. Surgiu teste na rádio Guanabara para locução. Passou em primeiro lugar, mas vender as capinhas rendia mais e o futuro “Homem do Baú” precisava ajudar nas despesas da casa.

Entre vários fatos com Silvio, acho que um especialmente despertou bastante interesse: o sequestro da filha Patricia Abravanel, em 2001. Não tanto pelo sequestro – por assim dizer – mas pela interlocução dele com o sequestrador. O Brasil parou para vê-lo negociar com maestria a liberação da filha. Governo, secretaria de segurança e afins envidaram esforços, mas quem reinou foi ele. Tanto que o sequestrador retornou à mansão da família dias depois. Talvez certo de que, ao lado do comunicador, estaria com a integridade preservada. Pela segunda vez, Silvio conduziu e acabou tudo bem.

Generoso, deu oportunidade a muitos artistas (iniciantes e outros já no ostracismo),  acolheu, cuidou, mantinha, se necessário, o plano de saúde de alguns colaboradores mesmo após desligamento de suas empresas. Visionário, já apresentava artistas LGBT+ numa época em que não se abordava essa pauta. Unanimidade até entre concorrentes, com a notícia da morte dele, a programação das principais emissoras foi interrompida imediatamente para a merecida repercussão. Também foi enredo de escola de samba, tema de tese de doutorado, candidato à Presidência da República. Existem vários livros sobre a vida dele e está previsto para 12 de setembro o lançamento da cinebiografia   “Sílvio”, na qual é interpretado por Rodrigo Faro.

Apesar de exímio comunicador, Silvio era low profile, de poucas entrevistas, não gostava muito de ser o centro das atenções. E um dos pedidos, segundo a família, foi não explorar a passagem, seguir direto para o cemitério para a cerimônia judaica. Cuidadoso com as pessoas e ciente da importância dele para o país, preferiu a discrição. Não para desprezar a homenagem, mas para garantir o bem-estar do povo, acredito eu. Ele sabia que o velório aberto de uma figura querida como ele ia parar São Paulo. Congestionamento, tumulto, filas quilométricas, gente desmaiando… Mas fã é fã. Mesmo com o sigilo, descobriram o cemitério e muitos já passaram a noite lá.

Senor Abravanel, Silvio Santos,  O Homem do Baú,  O peru que fala… Sagaz até na hora de sair de cena, Silvio “desligou” o microfone numa madrugada de sábado. Assim, teríamos o final de semana inteiro de notícias, incluindo o domingo, dia no qual ele brilhou por décadas.

Neste momento, só o imagino lá em cima fazendo piada com Pedro de Lara, Aracy de Almeida, Gugu, Hebe… E como ele mesmo cantava:  “do mundo não se leva nada, vamos sorrir e cantar”. Vamos sorrir, cantar e retribuir toda a alegria que ele nos proporcionou, afinal, “o Silvio Santos é coisa nossa”.

*Comunicóloga, docente, redatora, revisora e roteirista.

adm

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