Caso Larissa Manoela – atriz é vítima de abuso patrimonial?

JUSTIÇA

O caso do rompimento familiar e societário da atriz Larissa Manoela, de 22 anos, com os pais e então empresários e responsáveis por sua carreira, Silvana Taques e Gilberto Elias, ganhou todos os holofotes desde o último domingo (13), quando a atriz rompeu o silêncio e falou sobre a gestão de seus bens. Larissa, que iniciou sua carreira aos 4 anos, contou em entrevista concedida ao “Fantástico” que descobriu possuir apenas 2% da sociedade de uma das empresas abertas para gerenciar seu patrimônio e contratos profissionais, enquanto os pais somavam 98% dessa pessoa jurídica.

Essa empresa teria sido aberta quando a artista ainda era menor de idade. Larissa contou que ao questionar os pais, eles alegaram que as cotas eram divididas igualmente entre os três, com cerca de 33% para cada. A artista contou ainda que uma outra empresa foi aberta quando ela já era maior de idade, sendo ela a única sócia, porém com os pais tendo “plenos poderes” de decisão sem depender de sua autorização. Segundo Larissa, ao descobrir todas essas situações, ela optou por abrir um outro CNPJ, desta vez sob sua inteira responsabilidade, para ela mesma administrar de perto sua carreira e novos contratos.

A defesa dos pais, por meio de nota divulgada por seus advogados, nega o abuso financeiro, diz que Larissa tem total acesso a meios financeiros, inclusive utilizando cartões de crédito Black e Platinum. Afirma tal nota que os pais sempre zelaram da melhor maneira possível pelo patrimônio da filha e que a Larissa diz “inverdades” quando acusa os mesmos.

O advogado André Andrade, especialista em Direito de Família, Sucessões e Planejamento Sucessório, esclarece pontos importantes sobre a situação, que está sendo denunciada pela atriz como um caso de abuso patrimonial.

Quais os poderes dos pais quando os filhos são menores de idade? Há limites?

O art. 1.689 do Código Civil estabelece que, por serem os menores de 18 anos incapazes, compete aos pais administrarem os bens dos filhos menores. Assim, tanto o pai quanto a mãe – ou, na ausência deles, o responsável legal pela criança – têm o dever de administrar os bens até que os filhos completem a maioridade.

Com os 18 anos completos, essa obrigação se extingue, pois o filho adquire capacidade civil e é extinto também o poder familiar.

Porém, o poder de administração dos pais não é absoluto. A lei também estabelece limites à administração dos bens, definindo, dentre outras limitações, que os pais não podem realizar negócios jurídicos que reduzam o patrimônio da criança ou contrair obrigações que ultrapassem os limites da simples administração.

Assim, os pais têm o poder de administrar os bens dos filhos menores, inclusive revertendo recursos provenientes destes bens para satisfazer necessidades dos próprios filhos, mas não podem extrapolar os limites da mera administração do patrimônio.

E no caso da Larissa Manoela, podemos perceber alguma violação de direitos? 

Por ser um caso concreto e não se ter acesso a todos os detalhes, não se pode afirmar se, de fato, houve violação de direitos.

Com as informações divulgadas na mídia e através das entrevistas da própria Larissa Manoela, é possível que os pais tenham agido com abuso de poder, extrapolando os limites da administração dos bens, o que pode ser o que pode ser considerado ato ilícito passível de responsabilização.

Se isto realmente tiver ocorrido, é direito da atriz ajuizar um processo judicial contra seus pais para reaver a parte do patrimônio que perdeu, mas a própria Larissa já afirmou, em entrevista nesta semana, que não pretende fazer isso.

Os pais precisam prestar contas para os filhos quando fazem a administração do patrimônio?

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) possui o entendimento de que, de forma excepcional, quando há suspeita de abuso de direito por parte dos pais, os filhos que têm os bens administrados podem propor uma ação de prestação de contas.

A ação de prestação de contas é, basicamente, ajuizada por aquele que tem seus bens ou direitos administrados por outra pessoa, servindo essa ação para que o administrador justifique o que vem sendo feito com o patrimônio.

Uma observação importante feita pelos ministros do STJ é que cabe ao filho que tem seus bens administrados comprovar o abuso de direito, pois, se isto não for feito, o pedido de prestação de contas não será acolhido.

Afinal, o que pode ser feito em casos como esse?

A solução jurídica adotada por Larissa Manoela foi renunciar ao patrimônio conquistado antes de atingir a maioridade e retirar os pais da administração das empresas, enviando para eles um distrato (documento que põe fim ao contrato que anteriormente existia). Com isso, ela própria passará a ser sócia-administradora, ou pode vir a colocar um terceiro para administrar seus bens.

Cabe lembrar que muitos dos contratos firmados por Larissa Manoela em sua carreira não foram como pessoa física, mas sim como pessoa jurídica, ou seja, por meio destas empresas. O que a atriz vem tentando fazer é alterar as partes contratantes: na prática, ela deseja passar a ter todos os seus contratos firmados por meio de uma outra empresa, que também lhe pertence e que não tem participação de seus pais na administração.

Porém, abrir mão do próprio patrimônio não é a única resolução em casos como esse. O Código Civil prevê a responsabilização dos administradores tanto em relação aos sócios quanto em relação a terceiros nos casos em que ocorram prejuízos no exercício da função de administração.

Para além de uma eventual responsabilização dos administradores, vislumbra-se também a possibilidade de se pleitear uma indenização pelos danos materiais sofridos referente aos contratos empresariais que parecem ser excessivamente onerosos para uma das partes, fugindo em muito dos percentuais de mercado destinados, por exemplo, a agentes que administram uma carreira artística, muito possivelmente se aproveitando de uma parte hipossuficiente, ao menos inicialmente, dentro dessa relação.

 Sobre André Andrade

Advogado, inscrito na OAB/BA 65.674, bacharel pela Universidade Federal da Bahia, pós-graduado em Advocacia Contratual e Responsabilidade Civil pela EBRADI, em parceria com ESA-SP, membro associado da Academia Brasileira de Direito Civil (ABDC) e mestrando em Família na Sociedade Contemporânea na UCSAL. Atualmente é sócio proprietário do André Andrade Advocacia & Consultoria, escritório especializado no Direito das Famílias, Sucessões e Planejamento Sucessório, atuando também nas mais diversas áreas através de parceiros especializados. Contato: @advogadoandreandrade / 71 99976-8547

adm

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